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Nossas redes
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A grama do lado de lá, de Alisson Carvalho

Foto: Caio Negreiros
Foto: Caio Negreiros

Do pouco de tudo que tinha, tiraram-me o nada.

Eu, assim como os vizinhos, olhava para a grama alheia sem grandes invejas, meu negócio mesmo era desejar furtivamente todos os quebrantos do mundo para a tal grama verde. Que diabos alimentava aquelas raízes robustas que sobreviviam impávidas ao sobrepeso do maldito dono?

Eu já não suportava ter que escutar a melodia arrítmica dos elogios lançados ao jardim mais bem cuidado do bairro. Para se ter uma ideia do quão superestimado ele era, até a primeira-dama frisara, em discurso oficial, as qualidades do cuidador do tal jardim, inclusive metaforizando o empreendimento e comparando-o ao esforço político… Até engasguei ao escutar que o consideraram um modelo para a cidade.

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Depois disso não teve mais jeito, o “verdume” da grama virou capa de revista, objeto de estudo de botânicos e, sabe-se lá porque, até matéria para programa de jornal.

Arrastei-me pelas entranhas venenosas da inveja, degustei o gosto do fel do sucesso alheio e tudo não passou de um amargor torturante. Meu sorriso deixou de ser mecânico para assumir a monstruosidade da mentira. E, movido pelas serpentes internas, deixei que a língua atuasse por alguns instantes e espalhasse injúrias, estórias ferinas.

A grama do vizinho não era apenas bela, era como uma pintura impressionista com pinceladas dissociadas, complementares e vibrantes. Como e porque ela era diferenciada? Haviam teorias diversas, desde mãos boas do cuidador cujo dom veio do berço, até uso de substâncias ilícitas durante o processo de adubagem. Todas, obviamente, tendendo para a improbidade nata do indivíduo-dono-do-jardim.

Deixamos, gradativamente, que as ervas daninhas se aninhassem nos nossos jardins. Primeiro passamos a ignorar nosso terreno, posteriormente empreendemos todo o tempo na observação maldosa do jardim do vizinho, por fim tentamos sabotar a beleza da grama alheia.

Alguns “sem-quereres” meus perderam o grau inovador pela recorrência dos casos e a tal ação viralizou, pois já que não podíamos ter o tal jardim dos sonhos, preferimos destruir o desviante. Como? Deixei algumas vezes a minha lixeira cair no terreno paradisíaco, outros moradores das adjacências seguiram a onda. Percebemos como era mais fácil tornar outros medíocres do que se esforçar para nos aperfeiçoarmos. Destruir o jardim alheio foi menos trabalhoso do que cultivar o nosso, contudo não funcionou.

E pouco adiantou os danos infringidos contra o vizinho, em questão de minutos a tal grama estava impecável. Ao passo que a nossa grama virou mato e o mato virou matagal, acomodou répteis peçonhentos e tantas vespas que foi impossível continuar residindo ali. A “feiura” das nossas terras ampliou a beleza da grama do vizinho.

Descobrimos, a contragosto, o que é a rijeza do método. A teimosia, persistência e a força de vontade do vizinho superou a sabotagem. Nem todos os gafanhotos vomitados pelas nossas bocas foram suficientes para destruir o verde circunscrito naquele pequeno espaço, porém impecável e, por isso, invejável.

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